quarta-feira, 27 de março de 2013

CRÔNICA DE UM CASAMENTO - Oswaldo Romano





CRÔNICA DE UM CASAMENTO

Oswaldo Romano

            Acabei sendo um profissional da fotografia, quando fazia parte e um dos fundadores do Velocino Moto Clube. Depois das nossas doidas excursões, amplamente fotografadas, não resistíamos a curiosidade de ver o resultado das nossas aventuras.

 Caiuby, dono de uma Norton 500CC, um de nossos companheiros, morador do bairro Alto da Lapa, tinha orgulho pessoal do laboratório fotográfico existente no subsolo da sua casa, deixado pelo falecido pai.

            Foi ajudando-o nas revelações desde os negativos às ampliações que aprendi, tomei gosto, li muito a respeito,  me aperfeiçoando nessa arte. Montei laboratório próprio e parti para tirar proveito, ganhar algum.

            Era um fotografo a disposição. Pilotando uma Harley 1200CC, levando meu equipamento à tira colo, achava que fazia sucesso. Os mais rentáveis trabalhos, primeiro casamentos, depois formaturas, festas e jornais. Considerava ainda como bico, uma vez que o horário de trabalho era à noite, e sábados e domingos. Laboratório de madrugada! Como bico ganhava bem, tinha orgulho do serviço, na época considerado técnico, pois, poucos conheciam o manuseio das complicadas câmeras e o milagre das revelações em intrincadas banheiras e seus sais.

            Um dia,  prometi deixar esse gostoso e cansativo trabalho, teria preferido que o dia não existisse. Pena, porque até então não havia a película colorida e ela estava chegando, revolucionária. Meu colorido era  pintura com guache, assim enobrecia as poucas e principais fotos, mas longe do cromo da Kodak.

            Foram muitos os casamentos. Filmagens, só eventuais com câmera de 16 mm. Câmeras de 35 mm, raras e impossíveis levá-las na igreja. Só preto e branco. Os casamentos eram antecipadamente publicados nas igrejas, fonte da maioria das futuras reportagens. Endereços? O coroinha responsável, gratificado, fornecia. Mas aquele dia...

            Como nem todo equipamento era da mesma geração, estava sujeito a surpresas. Tinha a sincronização do flash, que a abertura do diafragma deveria acontecer variável conforme a luz, e porque não  dizer: Meu estado de espirito. E a sensibilidade do filme... Tudo era surpresa quando da revelação. Fora do mês de maio, dias de poucos casórios, nessa temporada oferecia até desconto, como o casamento desta história, igreja e festa.

 O casal, noivo e noiva,  eram bem morenos, bem apanhados, mas de poucos recursos, diria que simples, mas cheios de expectativas com a festa e seu álbum. Usei quatro rolos de filmes. Na revelação, um não registrou nada, as 36 fotos saíram queimadas, pretas. Foi o rolo em que os noivos posam, aqui, ali, sorri, ela sentada, ele de pé. É justamente esse!


  Só vi isso quando já estavam na lua de mel. Na volta doidos para verem as provas, receberam a triste notícia. Eu tinha que explicar, não foi fácil, mas como se os demais foram bons? Sabe Baltazar, poderia culpar a fábrica, mas não, eu coloquei o rolo errado, ele girou mostrando a face externa e não o lado de impressão da película. — Um profundo silêncio tomou conta do ambiente. Fiquei emocionado, ela verteu lagrimas. Baltazar, eu disse: E agora? Novo silêncio. Olhavam para o chão – acompanhei, meditamos. Quebrando o clima arrisquei uma solução, talvez a única. Vestirem-se novamente.


Esperei temeroso sua reação. Matutei... um baita/azar mesmo, seu Baltazar. Deu certo, suspirei. Improvisamos cenários no local, alguns fiz na técnica de laboratório, completei o álbum, caprichei no retoque das profundas olheiras da noiva, naturais na volta de uma lua de mel.
            A falada gota d’água transbordou pondo fim nessa minha profissão.




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